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  • Foto do escritorMarcelo F Carmo

A falsa casa da tia Gercina

Atualizado: 12 de jun. de 2021


Nunca conheci a dona da casa. Como assim? Vou explicar, esse local foi o primeiro trabalho da minha mãe quando chegou em São Paulo vindo do Mato Grosso — ainda era um estado só, foi dividido em 1977. Quando ela era apenas a Ilda e não, ainda, à mãe do Maurício, Marcelo e Paulo. Vamos aos esclarecimentos: nesse trabalho minha futura mãe conheceu minha futura tia Gercina que apresentaria minha futura mãe ao meu futuro pai; foi ali que iniciou esta história de amores, desamores e dessabores. Esquina da Alameda Ribeiro da Silva com a Barão de Piracicaba. Depois do namoro e casamento do Geraldo e da Ilda, minha tia continuou trabalhando e morando lá, frequentemente íamos ver minha tia ali. Era uma esquina toda para à mansão, entrávamos pelo portão dos fundos, na Barão de Piracicaba, que era também a garagem, mas não lembro de ter visto carros entrando ou saindo. Era um portão enorme que dava para um quintal cheio de árvores, com quase nada de sol, uma campainha barulhenta era o primeiro passo que meu pai sempre encabeçava, era um terreno úmido e cheio de folhas, folhagens putrefatas que cobriam o solo quase que totalmente. Uma alameda de paralelepípedos levava até o limite do terreno, que era enorme. À direita ficava a escada que levava à cozinha, único lugar da mansão que tínhamos acesso. À esquerda uma edícula onde ficava o quarto da minha tia e um canil. Da alameda para à cozinha, tinha um caminho de octógonos de concreto, que fazíamos pulando de um em um. Lembro que entre as inúmeras árvores haviam muitas jabuticabeiras. O quarto da tia Gercina era minúsculo, não lembro de ter janela, uma cama e uma penteadeira com um espelho velho com algumas fotografias dos meus primos; Lála e Niel, que não moravam com à mãe. Quem morava no emprego praticamente não tinha folga, muitas vezes minha tia tinha que interromper a visita pra atender os patrões.

Depois da escada da cozinha tinha um jardim todo ornamentado com bancos e mesas de ferro do século XIX, éramos proibidos de ir até lá, mas não éramos crianças tão obedientes, lembro de algumas vezes que escapamos e fomos até o jardim. Tenho muita lembrança do café com leite que minha tia sempre nos servia, não tínhamos o hábito de café com leite em casa, daí à lembrança desse evento marcante pra mim, às coisas eram difíceis economicamente em nossa família, café bem ralo e chá de cidreira era o que tomávamos. Outra recordação que tenho da minha tia era o hábito de molhar a ponta do dedo na boca para mudar às páginas de um livro, foi à primeira pessoa que tenho na lembrança fazendo isto. Meu pai não era alfabetizado, minha tia não tenho certeza, mas lembro dela manuseando um livro e com esta particularidade, que até hoje associo a ela.

Estávamos na década de 80, minha tia trabalhou nesta casa até se aposentar. Era á casa falsa da minha tia, depois voltou para sua verdadeira casa lá em Itapevi onde viveu até o ano de 2021, foi uma dos 482.135 mil brasileiros vítimas da Covid 19 — até o momento. À dinastia de meu pai segue no declínio natural da existência humana.


Marcelo F cARMO

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