“Nada nem ninguém vai me calar!” Quanta presunção numa única frase. São tantas circunstâncias impostas, por fatores aleatórios, na experiência de se manter vivo — de maneira plena — nesse curto intervalo de tempo chamado vida. São tantas possibilidades de nos calarem que não é bom nem pensar. Somos um mecanismo tão frágil, que num atendimento de emergência que necessite de uma intervenção respiratória — entubação — e num detalhe o socorrista botar mais força do que deveria, já era! Pra restaurar o que julgamos natural, é um processo doloroso e nem sempre isento de rastros profundos.
Meu caso começou nos dedos da mão direita, dificuldade pra abrir garrafas de refrigerante, avançou pela mão e braço, foi quando procurei um médico e detectamos — eles — que era ELA, a partir daí, até ceifar minha voz, foram só cinco anos — de muitas perdas. É até irônico, mas no raro universo de diagnosticados com doenças neuromusculares ainda sou classificado como um paciente sortudo! Um paradoxo.
Nesse curto intervalo de dor e angústias, muitíssimas coisas rolaram ladeira abaixo, só à covid 19 — até o momento — fez 386.623 brasileiros mortos. O leque de angústias tem se mostrado voraz, ceifou vidas e ampliou feridas. Sigo vivo demais pra estar morto e morto demais para estar entre os vivos.
Marcelo F cARMO